Logo Cesar Peres Dulac Müller

BLOG CPDMA

Categoria:
Data: 30 de novembro de 2023
Postado por: Equipe CPDMA

O novo capítulo da disputa judicial envolvendo o termo “HELLES”, registrado como ‘marca’.

Imagem ilustrativa do artigo de Vanessa Pereira Soares sobre o termo Helles

Relembrando o caso…

Tudo começou no início de 2019, quando a cervejaria caxiense Fassbier notificou extrajudicialmente uma série de fábricas de cerveja do Rio Grande do Sul pelo suposto uso indevido do termo HELLES, alegando possuir a exclusividade de uso sobre a expressão, tendo em vista o registro da palavra como marca.

Não satisfeita com as notificações encaminhadas, em junho de 2019, a Cervejaria Fassbier ajuíza ação contra a Cervejaria Abadessa, na qual objetivava que a empresa fosse proibida de produzir e comercializar cerveja, inclusive liminarmente, utilizando a ‘marca’ de sua propriedade «HELLES», a qual insistia na exclusividade de uso, registrada perante o INPI desde 14/08/2007, sob o nº 826076564.

Inicialmente, houve o deferimento da liminar, oportunidade na qual a Juíza da 4ª Vara de Caxias do Sul, determinou a imediata abstenção de produção e comercialização de cerveja pela Cervejaria Abadessa, fazendo uso da ‘marca’ “HELLES”.

Tal decisão foi objeto de discussão em recurso de agravo de instrumento direcionado ao Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, que cassou a liminar, permitindo que a Abadessa continuasse suas atividades, fabricando e comercializando a cerveja do estilo HELLES.

Da sentença e sua reforma no Tribunal…

O processo foi sentenciado e o posicionamento da justiça de primeiro grau se manteve para proibir a Cervejaria Abadessa de produzir e comercializar produtos que contivessem a ‘marca’ “HELLES”.

Em sede de recurso de apelação, a 6ª Câmara do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, com sessão ocorrida no último dia 23, que reuniu os Desembargadores Niwton Carpes da Silva (Relator), Gelson Rolim Stocker e Eliziana da Silveira Perez deu provimento ao recurso de apelação promovido pela Cervejaria Abadessa, julgando improcedente a ação, no seguinte sentido: “considerando que a marca que a demandante pretende utilizar com exclusividade denominação - "Helles" se trata de expressão que não possui a originalidade necessária a ponto de se obrigar as demais empresas do ramo cervejeiro de abstenção do uso comercial, sendo cabível a mitigação da exclusividade do registro, o que também afasta de imediato a pretensão indenizatória”.

Desta decisão cabe recurso aos Superiores Tribunais.

Sobre o termo designativo de estilo de cerveja HELLES e o posicionamento do INPI…

Munich HELLES [1], ou simplesmente HELLES é um estilo de cerveja de cor clara, dourada, que lhe dá nome [2]. Em alemão, HELLES significa clara, pálida [3]. Ou seja, a clara de Munich. Tornou-se um termo técnico, utilizado na indústria, para designar a cerveja clara, doce, maltada e limpa no paladar. Também se enquadra como sinal de caráter genérico, necessário, comum ou simplesmente descritivo, quando tiver relação com o produto ou aquele empregado comumente para designar uma característica do produto quanto à natureza.

A marca, concedida à autora da ação, foi depositada junto ao INPI em 2003 e concedida em 2007 e por ter havido mais de 5 anos da concessão, não se conseguiria a declaração da nulidade do registro diante do advento da prescrição.

Ocorre que a Cervejaria Fassbier, certa de seu direito de exclusividade absoluta, pediu administrativamente a nulidade do registro da marca “RAIMUNDOS HELLES”, possibilitando então, ao INPI, manifestar-se sobre o registro da ‘marca’ concedida em 2007.

No julgamento do processo administrativo de nulidade, a autarquia afirmou que as marcas objetos dos pedidos de nulidade - RAIMUNDOS HELLES, se utilizam da mesma expressão que compõe a marca HELLES da requerente FASSBIER, contudo, entendeu não se tratar de hipótese de anulação dos registros, pois HELLES é “um estilo de cerveja tradicional de Munique, Alemanha” (https://pt.wikipedia.org/wiki/Helles) e por tal razão, serve para designar cervejas ou qualquer produto/serviço relacionado à bebida, sendo ausente a distintividade e portanto, irregistrável à título exclusivo como marca, sob pena de infração ao artigo 124, VI da LPI.

Completou ainda que, […] “Talvez, em razão deste fato – de ainda não se encontrar difundido no Brasil, em 2007, este tipo de cerveja – a terminologia “Helles”, desacompanhada de qualquer elemento capaz de revestir-lhe de suficiente forma distintiva, foi concedida como marca à requerente do PAN, equivoco praticado pelo INPI que, contudo, não pode justificar a perpetração de outros pelo Instituto, pois, se assim o fosse, o que estaria a se fazer com a concessão de tal marca não seria apenas conferir o direito ao uso exclusivo como tal à requerente para designar cervejas, seria, em verdade, conferir-lhe exclusividade de utilização, no segmento cervejeiro, de uma palavra do patrimônio comum de todos aqueles que atuam neste setor, o que é inadmissível” […]

Por fim, merece destacar o trecho do voto do Desembargador Ney Wiedemann Neto na ocasião do julgamento do agravo de instrumento que cassou a liminar deferida em primeiro grau para proibição de fabricação e comercialização da cerveja do tipo Helles pela Abadessa, no qual o julgador refere que: “Fazendo um comparativo com o vinho, seria o mesmo que impossibilitar a denominação de um vinho Merlot de uma determinada vinícola com a referida expressão no rótulo da garrafa, que nada mais é do que um tipo de casta de uva, em razão do registro de uma marca de vinícola com a referida denominação “MERLOT” [4] .

A decisão proferida pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul vem como um precedente de extrema importância e repercussão, que assegura, ao menos nesse momento, que a Fassbier não seguirá processando outras cervejarias objetivando a abstenção de uso do termo HELLES.

Processo: Apelação n.º 5000464-83.2019.8.21.0010


[1] Lei 9.279/96. Art. 124. Não são registráveis como marca: XVIII - termo técnico usado na indústria, na ciência e na arte, que tenha relação com o produto ou serviço a distinguir;

[2] Lei 9.279/96. Art. 124. Não são registráveis como marca: VI - sinal de caráter genérico, necessário, comum, vulgar ou simplesmente descritivo, quando tiver relação com o produto ou serviço a distinguir, ou aquele empregado comumente para designar uma característica do produto ou serviço, quanto à natureza, nacionalidade, peso, valor, qualidade e época de produção ou de prestação do serviço, salvo quando revestidos de suficiente forma distintiva;

[3] Lei 9.279/96. Art. 124. Não são registráveis como marca: VIII - cores e suas denominações, salvo se dispostas ou combinadas de modo peculiar e distintivo;

[4] Trecho do voto do Desembargador Relator Ney Wiedemann Neto na ocasião do julgamento do agravo de instrumento que cassou a liminar deferida em primeiro grau para proibição de fabricação e comercialização da cerveja do tipo Helles pela Apelante Abadessa (Agravo de Instrumento nº 5005803-05.2019.8.21.7000, julgado em 05/12/2019).

Por: Vanessa Pereira Oliveira Soares

Propriedade Intelectual | Equipe CPDMA

Voltar

Posts recentes

STJ decide que stock options (opção de compra de quotas ou ações) não podem ser penhoradas

No dia 05 de novembro, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça decidiu, por meio do julgamento do REsp 1841466[1], de relatoria do Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, pela impossibilidade de penhora de stock options. O julgamento do caso centrou-se na possibilidade de um terceiro vir a exercer o direito de compra de ações em […]

Ler Mais
Governança em empresas familiares: estruturas e instrumentos essenciais

A governança corporativa em empresas familiares tem ganhado cada vez mais relevância no cenário empresarial brasileiro, no qual cerca de 90% das empresas possuem controle familiar. A ausência de um planejamento adequado para a sucessão do negócio e a dificuldade de manter a harmonia nas relações familiares, em muitos casos, culminam no fracasso da empresa […]

Ler Mais
A resolução nº586/2024 do CNJ e o futuro dos acordos na Justiça do Trabalho

No dia 30/09/2024 o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aprovou, por unanimidade, a Resolução nº 586, por intermédio do Ato Normativo 0005870-16.2024.2.00.0000, o qual disciplina a realização de acordo entre empregado e empregador na rescisão do contrato de trabalho, por meio de homologação na Justiça do Trabalho, com a quitação geral do contrato. Ou seja, […]

Ler Mais
A legitimidade das associações e fundações para o pedido de recuperação judicial e a nova posição do STJ.

No início do mês de outubro, a 3ª Turma do STJ, por maioria de votos, proferiu decisão em quatro recursos especiais (REsp 2.026.250, REsp 2.036.410, REsp 2.038.048 e REsp 2.155.284) se posicionando pela ilegitimidade ativa das fundações sem fins lucrativos para o pedido de Recuperação Judicial. A decisão, inédita até então, parece, em primeira análise, […]

Ler Mais
Governo do RS estabelece programa em recuperação II: parcelamento para empresas em recuperação judicial

O Governo do Estado do Rio Grande do Sul instituiu o Programa em Recuperação II, por meio do Decreto nº 57.884 de 22 de outubro de 2024, com o objetivo de permitir o parcelamento de débitos tributários e não tributários, de empresário ou sociedade empresária em processo de recuperação judicial, inclusive para contribuinte cuja falência […]

Ler Mais
Renegociação de R$ 60 bilhões em dívidas de empresas em recuperação judicial é regularizada pela PGFN

Com informações do Jornal Valor Econômico.Link da matéria original: http://glo.bo/3NOicuU Desde 2020, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) tem avançado em negociações para regularizar dívidas de empresas em recuperação judicial, resultando na renegociação de cerca de R$ 60 bilhões. O número de empresas regularizadas triplicou, atingindo 30% dos casos, graças a uma abordagem mais colaborativa da […]

Ler Mais
crossmenuchevron-down
pt_BRPortuguês do Brasil
linkedin facebook pinterest youtube rss twitter instagram facebook-blank rss-blank linkedin-blank pinterest youtube twitter instagram