Logo Cesar Peres Dulac Müller

BLOG CPDMA

Categoria:
Data: 1 de abril de 2020
Postado por: Equipe CPDMA

Em tempos de pandemia global, a falácia que o Estado deverá indenizar os custos da relação de trabalho

Em virtude da pandemia do Covid-19, mais conhecida como coronavírus, bem como respeitando o Decreto Legislativo nº 6, de 20 março de 2020, que declarou estado de calamidade pública em todo o território do nacional, estados e municípios publicaram medidas para evitar a aglomeração de pessoas, a fim de reduzir a disseminação do vírus. Dentre estas medidas, destaque para a proibição da abertura temporária de vários estabelecimentos, como shopping centers, escolas, universidades, entre outros. 

Conforme as autoridades públicas de saúde, o contágio se dá com extrema facilidade, sendo necessário aplicar uma política de isolamento da população. A finalidade, em que pesem os inconvenientes da quarentena, é nobre: preservar vidas humanas. Assim, todos devem trabalhar para a redução de riscos dos trabalhadores, dos familiares destes, dos diretores e dos colaboradores de uma empresa, evitando que contraiam e disseminem indiscriminadamente o vírus. A prioridade é a vida.

Tais situações, no entanto, vêm ocasionando incertezas e insegurança jurídica nas relações de trabalho. Uma das principais dúvidas é quanto à aplicação do artigo 486 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) para responsabilizar o estado ao pagamento dos encargos trabalhistas. Este tema específico ganhou alta relevância na mídia e nas redes sociais.

O artigo 486 da CLT, em seu caput, informa: “No caso de paralisação temporária ou definitiva do trabalho, motivada por ato de autoridade municipal, estadual ou federal, ou pela promulgação de lei ou resolução que impossibilite a continuação da atividade, prevalecerá o pagamento da indenização, que ficará a cargo do governo responsável”.

Para o Direito do Trabalho, tal circunstância só ocorre quando a Administração Pública impossibilita a execução da atividade do empregador, provocando a paralisação temporária ou definitiva da empresa, ficando responsável pelo pagamento de indenizações aos trabalhadores. 

O doutrinador Sergio Pinto Martins cita o seguinte exemplo: “(...) ocorreu em São Paulo, mais precisamente na rua das Palmeiras, que foi fechada para a construção do Metrô. Não passavam veículos no mencionado logradouro, e os pedestres, para utilizarem a referida via, tinham certas dificuldades, dados os tapumes, buracos, terra que enfrentavam. O comércio naquele local praticamente ficou inutilizado, sendo que muitas empresas fecharam”. 

Ou seja, a previsibilidade do fato que gerou suspensão das atividades comerciais se originou de um ato público. Assim, a Administração Pública foi a causadora do prejuízo da atividade profissional, ensejando ao pagamento de indenização pelo governo aos trabalhadores daquelas empresas. Tal situação é conhecida no mundo jurídico como ‘‘fato do príncipe’’ ou factum principis. 

Entretanto, o parágrafo único do artigo 1º da Medida Provisória nº 927, reconhecida pelo Decreto Legislativo nº 6, determinou a possibilidade de ‘‘força maior’’, nos termos do artigo 501 da CLT.

Acontecimentos de ‘‘força maior’’ são até previstos, mas não podem ser impedidos, como terremotos, inundações, pandemia etc. Em outras palavras, não decorrem da ação humana, mas de eventos de natureza ambiental, como no caso dos desastres naturais. 

De acordo com o artigo 501 da CLT, se entende como ‘‘força maior’’ todo o acontecimento inesperado e inevitável, em relação à vontade do empregador, e para realização do qual este não concorreu, direta ou indiretamente. 

Contudo, é extremamente raro o reconhecimento da Administração Pública como causadora do prejuízo, uma vez que devemos levar em consideração o direito à vida, previsto no caput do artigo 5º da Constituição Federal. 

A jurisprudência sinaliza que somente se aplica o artigo 486 da CLT quando houver prenúncio do fato que originou a suspensão parcial e total da atividade comercial. 

Assim, concluímos que o artigo 486 da CLT não se aplica nos casos de ‘‘força maior’’, como pandemia, principalmente se tratando de pandemia global. Neste caso, para frustração de muita gente, o Poder Público tem sua responsabilidade eximida, uma vez que nenhum direito poderá se sobrepor ao direito à vida.

Fonte: Rafael Franzoi, advogado da Cesar Peres Dulac Müller, é especialista em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho.

Voltar

Posts recentes

Contratos de Vesting Clássico e Reverso: aplicações no Direito Societário

Em diversas áreas do direito, nota-se a existência de algumas adaptações americanas em contratos, jurisprudências e demais moldes empresariais. No direito societário, especificamente, há contratos que, inclusive, mantiveram o nome original, como é o caso do contrato de vesting. Conforme mencionado anteriormente, o modelo de vesting surgiu nos Estados Unidos como um mecanismo para a […]

Ler Mais
Stock options como forma de incentivo aos empregados e sua importância para as startups

O fenômeno das stock options apareceu nos Estados Unidos na década de 50 e ganhou grande visibilidade após os anos 80, quando se tornou uma prática quase absoluta entre as empresas americanas de grande porte. Nos Estados Unidos, o auge do sistema de concessão de stock options ocorreu entre os anos de 2000 e 2001. […]

Ler Mais
Mudanças no Código Civil e seus reflexos no Direito Societário: Uma análise do Anteprojeto apresentado ao Senado Federal

A comissão de juristas nomeada pelo ministro Luis Felipe Salomão elaborou o anteprojeto de Lei para atualização e adequação do Código Civil, o qual atualmente aguarda análise do Senado Federal . O principal objetivo do anteprojeto é desburocratizar medidas estipuladas pela lei atual e adequar o Código a entendimentos doutrinários e jurisprudenciais, que já vêm […]

Ler Mais
A Pejotização e a validação das formas alternativas de contratação: impactos empresariais e a decisão do STF.

A decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento do Tema 725 de Repercussão Geral e da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 324, marca um ponto crucial na definição das relações de trabalho e seus limites legais no Brasil. Em um cenário em que as empresas cada vez mais buscam alternativas para […]

Ler Mais
Investimento em startups no Brasil: o Contrato de Mútuo Conversível em Participação Societária. 

Na era da tecnologia, o ecossistema de startups tem atraído muitas pessoas nas últimas décadas. Isso se deve, sobretudo, à rápida ascensão da economia digital, que proporcionou diversos casos de sucesso de empresas que hoje representam players gigantes no mercado, independentemente de qual setor atuam. Nesse contexto de iniciativas empreendedoras escaláveis, as startups se mostraram como um enorme atrativo […]

Ler Mais
Conheça a classe de ativos - DIREITOS AUTORAIS

Fechando a nossa série de posts sobre as Classes de Ativos da Propriedade Intelectual, trataremos hoje do registro de DIREITOS AUTORAIS. Autor é a pessoa física criadora de obra literária, artística ou científica. O direito autoral protege tais obras e pode ser patrimonial (direito de exploração comercial da obra) ou moral (reivindicação de autoria, conservação […]

Ler Mais
crossmenuchevron-down
pt_BRPortuguês do Brasil
linkedin facebook pinterest youtube rss twitter instagram facebook-blank rss-blank linkedin-blank pinterest youtube twitter instagram