Logo Cesar Peres Dulac Müller

BLOG CPDMA

Categoria:
Data: 27 de fevereiro de 2023
Postado por: Equipe CPDMA

Covenants financeiros

Imagem de um aperto de mãos com gráficos e moedas ao fundo representando covenants financeiros.

A crise financeira que acometeu a Americanas é notória e teve como origem “inconsistências contábeis” declaradas pela empresa em um fato relevante ao mercado. Todavia, as reverberações das referidas inconsistências, que obrigaram a empresa a ajuizar o pedido de processamento de sua recuperação judicial após o bloqueio dos seus ativos [1], são oriundos da quebra dos chamados covenants financeiros [2]

Covenants financeiros (podem ser traduzidos como cláusulas de garantias ou pactos financeiros) são cláusulas incluídas em contratos de financiamento que estabelecem requisitos e limitações para o devedor. Essas cláusulas visam a resguardar a saúde financeira do devedor mediante o cumprimento de certos parâmetros financeiros ou a presença de certas ferramentas de fiscalização. 

Os covenants são desenvolvidos com base nas condições específicas do empréstimo e perfil financeiro do devedor.  Dessa forma, os covenants são uma ferramenta de proteção ao credor, que poderá exigi-los ao devedor quando da negociação de um empréstimo. 

A sua natureza jurídica é mista: os covenants possuirão características de vencimento antecipado, permitindo que o credor monitore a solvência do devedor, como também de cláusula penal, uma vez que um dos efeitos dos covenants é a cobrança de multa pelo descumprimento de alguma condição obrigacional, não ocasionando, necessariamente, um inadimplemento da obrigação principal [3].

Alguns exemplos comuns de covenants financeiros incluem restrições sobre a tomada de dívidas adicionais, exigências de manutenção de certos indicadores financeiros, como rácios de endividamento e liquidez, relatos periódicos financeiros e restrições quanto à distribuição de lucros. 

Se o devedor não cumprir os covenants estabelecidos em seu contrato de financiamento, o credor pode ter o direito de tomar certas medidas, como cobrar antecipadamente o empréstimo ou negar futuros empréstimos. No entanto, tais medidas devem ser utilizadas com cautela, pois o credor também tem o interesse em manter uma boa relação com o devedor e garantir a recuperação de seu investimento.

É possível que o credor, ao se deparar com a quebra de covenants, não exija o cumprimento das penalidades impostas, concedendo uma Waiver Fee, que se trata de um instrumento por meio do qual o credor concede a dispensa, renúncia ou perdão pela quebra de certa cláusula pactuada anteriormente, ou a renegociação das limitações impostas à empresa [4].

Antes de assinar um contrato de financiamento, ambas as partes devem cuidadosamente considerar os covenants financeiros e seus impactos potenciais na situação financeira do devedor. É importante ter uma compreensão clara desses termos, para garantir que as partes entendam e aceitem as obrigações estabelecidas. Além disso, é importante considerar o momento da negociação dos covenants e os riscos de variações no cenário macroeconômico, para fins de impedir o descumprimento das obrigações assumidas em decorrência de variações externas que fujam do controle do devedor.

Inclusive, destaca-se, a possibilidade de renegociação entre credor e devedor em caso de eventual mudança estratégica da empresa, que necessite de maior alavancagem (e, consequentemente, não possa mais cumprir com os covenants assumidos [5]. É cotidiana a renegociação das referidas obrigações: em média, contratos de financiamento firmados com companhias abertas são renegociados a cada nove meses [6].

Em resumo, os covenants financeiros são ferramentas importantes para proteger tanto o credor quanto o devedor e garantir a saúde financeira a longo prazo do negócio. A avaliação cuidadosa e a compreensão dos termos dos covenants financeiros são fundamentais para garantir um financiamento equilibrado e bem-sucedido.

Por: Álvaro Scarpellini Campos

Direito Cível | Equipe CPDMA


[1] BTG Pactual consegue liminar para suspender R$ 1,2 bilhão da Americanas alegando o vencimento antecipado da dívida em razão da quebra das garantias contábeis firmadas;

[2] Utiliza-se como referência o seguinte trecho do pedido Tutela Cautelar em Caráter Antecedente ajuizado pela Americanas em 13/01/2023: “Em consequência, eventuais alterações poderão repercutir no grau de endividamento da empresa e no capital de giro mínimo, exigidos em contratos financeiros, inclusive internacionais, acarretando o descumprimento de cláusulas de “covenants financeiros” e “cross-default”, culminando no vencimento antecipado de dívidas da ordem de R$ 40 bilhões”- Processo nº 0803087-20.2023.8.19.0001, 4ª Vara Cível Empresarial da Comarca do Rio de Janeiro/RJ;

[3] Glitz, Frederico (2018): Covenants em Contratos de Financiamento de Longo Prazo: Uma Perspectiva Jurídica. p. 1386.

[4] Glitz, Frederico (2018): Covenants em Contratos de Financiamento de Longo Prazo: Uma Perspectiva Jurídica. p. 1385.

[5] Sobre a renegociação de covenants: “Vem aí a temporada de quebra de covenants” por Manuela Tecchio.

[6] Albanez, Tatiana (2020): Panorama dos covenants em contratos de dívida de empresas listadas na B3.  p. 17. FGV EAESP.

Voltar

Posts recentes

RS autorizado a implementar quitação e parcelamento de ICMS com redução de juros e multas

O Conselho Nacional de Política Fazendária - CONFAZ, visando facilitar a regularização dos débitos fiscais dos contribuintes, autorizou a implementação de um programa de quitação e parcelamento de débitos de ICMS no âmbito do Estado do Rio Grande do Sul, sejam eles inscritos ou não na dívida ativa, constituídos ou ajuizados. O programa prevê a […]

Ler Mais
Atenção às tentativas de golpes utilizando o nome Cesar Peres Dullac Müller Advogados

Reiteramos nosso compromisso contínuo em oferecer serviços jurídicos com excelência e segurança. Diante disso, alertamos sobre uma situação delicada que tem ocorrido no setor jurídico: recentemente, tomamos conhecimento de tentativas de golpes direcionadas a clientes de escritórios de advocacia. Gostaríamos de tranquilizá-los, assegurando que todas as suas informações processuais e pessoais permanecem integralmente protegidas. Esses […]

Ler Mais
STJ decide que stock options (opção de compra de quotas ou ações) não podem ser penhoradas

No dia 05 de novembro, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça decidiu, por meio do julgamento do REsp 1841466[1], de relatoria do Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, pela impossibilidade de penhora de stock options. O julgamento do caso centrou-se na possibilidade de um terceiro vir a exercer o direito de compra de ações em […]

Ler Mais
Governança em empresas familiares: estruturas e instrumentos essenciais

A governança corporativa em empresas familiares tem ganhado cada vez mais relevância no cenário empresarial brasileiro, no qual cerca de 90% das empresas possuem controle familiar. A ausência de um planejamento adequado para a sucessão do negócio e a dificuldade de manter a harmonia nas relações familiares, em muitos casos, culminam no fracasso da empresa […]

Ler Mais
A resolução nº586/2024 do CNJ e o futuro dos acordos na Justiça do Trabalho

No dia 30/09/2024 o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aprovou, por unanimidade, a Resolução nº 586, por intermédio do Ato Normativo 0005870-16.2024.2.00.0000, o qual disciplina a realização de acordo entre empregado e empregador na rescisão do contrato de trabalho, por meio de homologação na Justiça do Trabalho, com a quitação geral do contrato. Ou seja, […]

Ler Mais
A legitimidade das associações e fundações para o pedido de recuperação judicial e a nova posição do STJ.

No início do mês de outubro, a 3ª Turma do STJ, por maioria de votos, proferiu decisão em quatro recursos especiais (REsp 2.026.250, REsp 2.036.410, REsp 2.038.048 e REsp 2.155.284) se posicionando pela ilegitimidade ativa das fundações sem fins lucrativos para o pedido de Recuperação Judicial. A decisão, inédita até então, parece, em primeira análise, […]

Ler Mais
crossmenuchevron-down
pt_BRPortuguês do Brasil
linkedin facebook pinterest youtube rss twitter instagram facebook-blank rss-blank linkedin-blank pinterest youtube twitter instagram