Em épocas de crise econômica, muitas empresas, por temerem grandes prejuízos, optam por solicitar que seus funcionários se transformem em pessoa jurídica. Em que pese a burla dos direitos trabalhistas, é preciso considerar que o ônus de manter um empregado em conformidade com a lei trabalhista e seus direitos sociais é muito grande.
Tal conduta é conhecida como o fenômeno da “pejotização do trabalho”. A pejotização é simplesmente o empregado constituir empresa em nome próprio, passando, assim, a fornecer seus serviços às empresas contratantes através de uma relação interempresarial.
A jurisprudência assentada nos tribunais entende que a pejotização desvirtua e esvazia os direitos trabalhistas previstos em lei, já que permite ao empregador furtar-se ao correto e integral cumprimento da legislação trabalhista. Ou seja, como tal prática é considerada fraude às leis trabalhistas, o prestador de serviço consegue o reconhecimento do vínculo de emprego, uma vez que a prestação de serviços é pessoal, não eventual, onerosa e subordinada, nos moldes prescritos nos artigos 2º e 3º da CLT. Em decorrência, a empresa se vê obrigada a pagar todos os direitos devidos por lei, como décimo terceiro salário, férias, fundo de garantia etc.
Com o advento da Reforma Trabalhista (Lei 13.467, de 13 de julho de 2017), o legislador projetou parâmetros para que seja possível um desdobramento na pejotização, principalmente na figura denominada “autônomo exclusivo”, definida no artigo 442-B da CLT. Reza o dispositivo: “A contratação do autônomo, cumpridas por este todas as formalidades legais, com ou sem exclusividade, de forma contínua ou não, afasta a qualidade de empregado prevista no art. 3º desta Consolidação”. Tal mudança, como se percebe, traz mais segurança jurídica para o contratante, pois retira, por óbvio, o risco de o contratado ser reconhecido como empregado efetivo da empresa.
O objetivo de contratar um profissional autônomo como pessoa jurídica é diminuir os custos de uma contratação celetista. Nesta opção, não há previsão de pagamento de diversos direitos: décimo terceiro salário, férias, horas extras, fundo de garantia e, assim como, os de âmbito tributário. É que, uma vez formalizada a contratação do serviço, as alíquotas incidentes sobre o recolhimento da Previdência e do Imposto de Renda são menores, o que beneficia o prestador.
Importante salientar que o efetivo diferenciador entre o empregado e o prestador de serviços é a denominada subordinação jurídica. Os demais elementos, em regra, são comuns a ambos. A subordinação jurídica se caracteriza pela submissão às ordens e controle da prestação de serviços pelo empregador.
Para realizar a contratação, é imprescindível que este profissional autônomo satisfaça alguns requisitos: tenha inscrição no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ); tenha registro na Junta Comercial; seja cadastrado junto à prefeitura de sua cidade; possua um contrato de prestação de serviço com a empresa contratante; e esteja habilitado a emitir nota fiscal a cada prestação de serviço realizada.
A empresa contratante tem o dever de garantir as condições de segurança, saúde e salubridade dos profissionais autônomos, principalmente quando o trabalho for realizado em suas dependências ou em local por ela designado. O prestador de serviço tem total liberdade para realizar o serviço, podendo desenvolver as suas atividades na empresa ou mesmo em casa, sem receber ordens do tomador do serviço.
Contudo, a lei impede que as empresas demitam seus trabalhadores celetistas para, imediatamente, contratá-los como prestadores de serviços – seja como microempreendedor individual (MEI), seja como empresa limitada – para executar aquela função. O empregado que for demitido não poderá prestar serviços ao ex-empregador, seja como empregado da empresa terceirizada ou mesmo como sócio de terceira empresa, nos próximos 18 meses após o seu desligamento.
Ainda: o Supremo Tribunal Federal (STF), ao julgar a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 324/DF e o Recurso Extraordinário (RE) 958.252/MG, decidiu que é lícita a terceirização em todas as etapas do processo produtivo da empresa, seja meio ou fim.
Desta forma, esta alteração legal trouxe modernas formas de trabalho e a flexibilização nas relações de emprego, dificultando a identificação dos elementos caracterizadores do vínculo trabalhista. A empresa contratante deverá respeitar a liberdade do profissional autônomo em determinar a melhor maneira de desenvolver as atividades contratadas, abstendo-se de intervir na prestação de seus serviços.
Fonte: Rafael Franzoi, advogado da Cesar Peres Dulac Müller, é especialista em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho.